terça-feira, 9 de março de 2010

Pra frente é sem saber

(Escrito em Aparecida, na manhã do dia 10 de dezembro, e revisado pela a brilhante Leila Diniz) Começo a escrever minhas impressões, sensações, expectativas, emoções e medos quando faltam pouco menos do que quinze semanas para a aventura. Aventura sim, porque não vejo minha ida para a Nova Zelândia como viagem – ao mesmo tempo em que soa formal, viagem parece-me algo um quê rotineiro. Em 12 de março, despeço-me da minha família e dos meus amigos para manter contato com eles pela internet. Nem eles e muito menos eu vamos escrever cartas, o que seria, para mim, o mais essencial dos contatos. Sentir a espessura do papel e analisar a caligrafia seria como receber um caloroso abraço e ver a expressão de um rosto alegre, triste, risonho, fechado – um rosto apenas amigo. Fazer o quê, afinal? Claro que fico feliz de que nossos laços tenham nó virtual. Mas confesso que me atrai mais o lado mais humano de trocar correspondências.

Desde que a aventura foi rabiscada até ser efetivada passaram-se anos. Não sei ao certo quando a ideia surgiu. Sei que ganhou força de 2006-07 para cá. Algo em mim me inquietava, e a perspectiva de conduzir minha vida sob a égide de um trabalho rotineiro causava calafrios. Era como o irromper de uma onda que não suavizasse nas areias de uma praia. Mas como um típico projeto governamental, a ideia foi engavetada em algum canto da minha burocracia mental. E foi remexendo – ou melhor, fazendo faxinas nessas gavetas – que reencontrei o plano de ter a experiência de me sentir um estrangeiro fora do Brasil. Nova Zelândia não tinha sequer entrado na minha lista de preferências. Outros países da Europa, da América do Norte e até da África trocaram a primeira posição do destino. Ao final e ao cabo, acabou sendo a escolha definitiva – muito mais pelo lado financeiro do que por qualquer outro porquê.

Para entender melhor as razões que me levam para a aventura na Nova Zelândia, talvez seja necessário apresentar a história de meus pais. De uma certa maneira, ambos são aventureiros – principalmente meu velho Seu Assis. Meu pai é filho de retirantes nordestinos. Nasceu em uma cidadezinha típica da caatinga do Nordeste brasileiro chamada Ipueiras, no Estado do Ceará. Saiu da terra natal lá pelos 20 anos de idade, depois de labutar na roça, para estudar. Fortaleza, Recife, Rio de Janeiro e São Paulo foram como conexões para desembarcar em Roma (Itália), onde permaneceu quase uma década na Cidade Eterna. Já minha mãe, com quatro anos de idade, atravessou o Atlântico. Meus avôs maternos deixaram o interior de Portugal nos anos de 1940 para viver no Brasil. Primeiro, no Rio e, depois, em São Paulo. Vai ver este DNA nômade finalmente deu as caras em mim.

Meu pai é quem sempre me incentiva nas minhas aventuras. E com essa, não foi diferente. Por ele, iria no dia seguinte à primeira projeção da ideia. E foi ele que, de uma forma ou de outra, serviu como catalisador. Chegou com aquele jeito pacato e disse se eu realmente gostaria de viajar ao exterior. Se era essa a minha vontade, perguntou o que eu tanto esperava para concretizá-la. Insistia que o tempo estava passando, que o fim do ano se aproximava e que a decisão deveria ser tomada logo antes que compromissos profissionais acabassem servindo indiretamente de empecilho. Compreendi bem o que meu pai quis dizer. E não deu outra. Pouco dias depois da conversa, cheguei em casa e falei: “Pronto, pai. Tudo resolvido. Vou em março”. Ele ficou surpreso. Não com a decisão. Mas sobre o quê: “Resolvido o quê, meu filho”, disse-me. Ri apenas. Este é o meu velho Assis. Vive com a cabeça no mundo da Lua, sem preocupação e nem nada que lhe tire o sono.

Em seguida, coloquei a pasta sobre a mesa e saquei dela uma curta apostila. Abri, folhei até as últimas páginas e, por fim, mostrei um país de pouco visibilidade para os brasileiros: Nova Zelândia. O sorriso cândido de meu pai era a bênção que ele diria logo após o “parabéns, meu filho; você tem a minha bênção”. Será que foi este o último diálogo que meu pai teve com meu avô, quando decidiu sair do sertão do Ceará para estudar, contrariando a vontade de meu avô que o queria trabalhando na roça? A interrogação surgiu agora, enquanto escrevo nestas invisíveis linhas do Word. Tão logo chegar em casa, irei transformar as curvas da interrogação em uma reta de exclamação. Além disso, é sempre oportuno reviver na memória os raros dias em que tive a oportunidade de estar em Ipueiras, ao lado de meus avôs paternos e outros familiares cearenses.

P.S. Primeiro texto referente a minha aventura pela Nova Zelândia

Um comentário:

  1. Que moleza é essa? Queremos novos posts. Afinal vc chegou ai já faz um tempão... rsrsrsrs Abração, amigo.

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